Mitologias

A origem do milho

Os espíritos Gojánéhj vivem nos rios. [...] São temidos por quem anda perto das águas: podem aprisionar a alma de uma pessoa. O cacique dos Gojánéhj é Maloloa. [...] A história do arco-íris conta como os gojanéhj se tornaram parentes do povo Gavião Ikólóéhj. uma mocinha solteira estava andando pela beira do rio e achou o ninho do passarinho i má xúvxuv, uma ave que gosta de morar pertinho da água. O i má xúvxuv é um Goján, não é só um passarinho. Procuramos nunca incomodá-lo. Se alguém o mata, pega febre... a mocinha ficou feliz porque achou o ovo no ninho. [...] Quando foi pegar, o ovo espocou na sua mão , escorreu e melou sua vagina. A moça engravidou – e era solteira! A barriga foi crescendo [...]. Não era criança, era Goján na barriga dela... (MINDLIN, et.al., 2001, p.65). Cacique Sebirop continuou assim a narrativa deste mito: existe uma fruta chamada sulsúlà. No tempo dessa fruta, as mulheres acharam um pé carregado e iam pegar, mas voltavam com o paneiro vazio porque ainda não tinha caído no chão. As frutas caem quando estão maduras. Mas a mocinha grávida de Goján trazia paneiro cheio. As outras reclamaram, nós trazemos paneiro vazio e você vem com paneiro cheio. Tinha alguma coisa, tinha gente atrás disso. Isso se repetiu por vários dias. Ela sempre ia depois das outras mulheres e voltava com o paneiro cheio. Um homem resolveu seguir sem que ela percebesse. Quando ela chegou no pé da árvore ela sentou e abriu as pernas. O arco íris saiu da perereca dela, subiu na árvore e derrubou muita fruta pra ela, depois disso voltou pra dentro da barriga dela. O homem viu isso e foi contar por pessoal na aldeia. Contou o que aconteceu. “O que nós vamos fazer?”, se perguntaram os homens. Planejaram cortar o arco íris. Quando ela foi de novo, eles acompanharam. Quando ela abriu as pernas e o arco íris saiu, eles cortaram com borduna, como se cortasse o umbigo. Um pedaço entrou pra dentro da sua barriga e o arco íris foi pro céu. Nesse momento ela engravidou mesmo. O arco íris é Goján também, é Goján de verdade. Nunca nós vimos Goján gente, nós vemos o arco íris por causa da mulher. “Vocês não podiam fazer isso porque isso era meu segredo, reclamou ela. O arco íris era como se fosse o pai da criança que estava crescendo na barriga dela e ficou cuidando de longe. Goján gente estava cuidando gravidez da mulher. Assim, ele pensou em fazer uma roça pra cuidar de seu filho. “Vou fazer roça de milho”, pensou. “Meu filho vai ser Goján gente”. Até então não tinha milho. Ele fez roça e plantou milho. O marido Goján falou pra ela ir colher o milho à noite, para os outros não descobrir, era segredo, ninguém devia saber quem era o pai da criança. Quando voltou pra aldeia, ela levou as espigas debaixo da lenha. Só que nessa aldeia tinha um macaco prego que pegou o milho do paneiro dela e saiu com ele na mão. O pessoal viu. Começaram a falar ma’ég, ma’ég. Pegaram o milho e perguntaram pra ela de onde vinha. Ela ficou de levar o pessoal na roça no outro dia. Goján ensinou ela fazer tudo com milho, macaloba, canjica, pamonha. O marido dela Goján, perguntou se havia mulheres querendo brigar, matar ela. “Leva elas lá na roça que eu dou um jeito nelas”, ele orientou. A moça levou as mulheres que não gostavam dela lá na roça para pegar muito milho. Ela ficou sentada esperando as outras encher seus paneiros. Elas foram enchendo. Quando foram colocar o paneiro na cabeça, a envira quebrou. As outras fizeram o mesmo a envira dos seus paneiros quebrou também. “A envira tá quebrando”, reclamaram. Nessa hora começou um chuvisquinho e a trovejar forte. As mulheres começaram a virar pombos e voaram embora. Foi Goján quem transformou as invejosas em pombo. Nunca mais voltaram. Por isso os pombos ficam cantando. Por isso, toda vez que a gente planta milho, temos convidar o Goján pra vir ver a colheita. Na primeira colheita a gente faz festa pro Goján vir comer canjica e tomar macaloba. Não pode ser a qualquer hora. Tem que ser na época do milho verde". (Narrativa Catarino Sebirop)

Posted in mitologias on Dec 12, 2019